Coprodução da criança intersexo enquanto sujeito de direitos

9 de junho de 2020 | Artigos | por Dionne Freitas

O campo de estudos em intersexualidade(s), no Brasil, não tem dado muito enfoque para contribuições de outros campos que participam, tanto quanto o saber biomédico, na produção de múltiplas realidades para pessoas intersexo. Ao considerar essa questão, passo a integrar um grupo interdisciplinar que se propõe a construir uma representação jurídica com vistas de garantir direitos de pessoas intersexo, o qual se torna o campo desta pesquisa. Deparei-me, nesse caminho, com uma lacuna no direito brasileiro especialmente no que diz respeito às infâncias intersexo. Para tanto, traçamos como objetivo desta pesquisa, analisar as condições que materializam a emergência da categoria criança intersexo enquanto sujeito jurídico específico de direitos a partir do grupo interdisciplinar que está se propondo a constituir um marco normativo-jurídico no que se refere à intersexualidade e infância. Ao propor acompanhar os processos desse grupo, uma série de dilemas éticos se impõem, o que me aproxima do método cartográfico da pesquisa-intervenção que, ao pressupor a não separação sujeito/objeto, proporciona elementos para pensar a relação ali produzida por meio de análise de implicação. Com uma pesquisa que se propõe situada, o grupo acompanhado se torna um catalisador das tecnologias jurídicas que atuam no processo de coprodução de uma categoria criança intersexo no direito. Dentre elas, apontamos a escuta jurídica como um fazer estratégico que abre alas para as tecnologias do fundamento e da argumentação, que acionam direitos como autonomia, autodeterminação e não-discriminação. Esses, quando mobilizados para a infância, apresentam uma série de especificidades, nem sempre consideradas nas argumentações do direito. O que leva, a partir dos debates, a duas observações, até certo ponto, contraditórias: 1) a demarcação de sexo no registro civil como uma intervenção cirúrgica, e 2) o desconforto e esquiva do campo jurídico frente a discussões sobre a sexuação dos corpos, especialmente na infância. Os achados levam essa escrita a encerrar tecendo continuidades para com uma perspectiva crítica ao adultocentrismo que cerca nossas práticas.

 

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